sábado, 20 de junho de 2015

A BFF




A minha vida tem uma Maria Teresa. Nela entrou num dia soalheiro do Outono de 1998. Ou 1999, agora não estou certa. Ela é melhor em datas do que eu.

Vestia uma calças pretas largas de corte clássico, camisa azul e blusão de ganga. Hoje seria banal o blusão de ganga. Em 1998 - ou 1999 - não era. Era inusitado e arrojado. Perfeito.

Bonita, trigueira e com ar franco. Assim era Maria Teresa.

Ela chegou tarde - caracteristicamente, vim a descobrir - à aula de Direito Constitucional. Teve de pedir licença para passar - o espaço para pernas era semelhante ao da easyjet - e fê-lo com ar de mea culpa polvilhado com um maravilhoso sorriso travesso.

Gostei logo dela. Senti-me logo atraída para ela.

Esta pode estar a parecer uma história de amor romântico, mas é uma história de amizade. Que é outra forma maravilhosa de amor.

Acabei por conhecê-la, como sabia que seria e teria de ser. Demo-nos bem, mesmo entre tantas outras pessoas. Mas lembro-me de sentir-me intimidada. Não, não foi bem isso. Senti-me desarmada. Foi isso. Nunca tinha conhecido alguém tão sem subterfúgios -logo eu que sou a rainha deles - e tão, à falta de melhor palavra, genuína. Não que ela fosse descomplicada ou básica, nada disso. Só era transparente. What you see is what you get.  Estranho.

Conheciamo-nos há um par de meses quando ela me ligou a dizer que tinha ficado sem carro e que se tinha lembrado que, como vivíamos relativamente perto, eu poderia dar-lhe boleia para a faculdade enquanto o carro estava no oficina. (Íamos religiosamente para a faculdade às 9h. Para jogar às cartas.) Que sim, claro. Não há problema nenhum. Claro. Fica combinado.

É um bocado esquisito, não achas? -Perguntei ao Super Gato, com quem já vivia - Quer dizer, eu nem a conheço muito bem. Não achas um bocado abusador?

Eu era muito mais fechada naqueles dias. Não introvertida, que nunca fui, mas muito ciente e zelosa do meu espaço. Mas foi esse primeiro passo que moldou a nossa amizade. Ela forçou-me a sair da minha zona de conforto. Ainda o faz.

As conversas sobre cocó são frequentes, por exemplo. Sim, cocó. Por alguma razão ela adora falar sobre isso, a frequência e a consistência. Como as crianças. Delicioso.

Ela conta as coisas que pensa, que aconteceram ou que deseja como ninguém. E nem me refiro à quantidade de pormenores desnecessários que debita. Ela conta as coisas em cru. Sem filtros.

E assim, numa dança e contra-danca de descobertas, fomo-nos aproximando. Até sermos inseparáveis. Numa época de incertezas, de aventuras, desventuras, desilusões e conquistas como foi a nossa viagem universitária, ambas longe do seio materno, que tanta falta nos fazia, fomos pilar, parede e teto uma da outra.

Passávamos horas ao telefone. Telefone fixo, que os telemóveis ainda eram para cima de uma fortuna. Víamos televisão juntas. Cada uma na sua casa, mas agarradas ao telefone. Tínhamos de mudar o auscultador de orelha frequentemente, de tão quente que ficava.

Íamos às compras. Íamos muito às compras. Descobrimos uma loja de chineses, ainda eram elas uma novidade, mesmo ao pé de minha casa e foi a loucura. Era tudo tão barato, tão fashion e de boa qualidade. Não era. Agora sabemos isso. As fotos não mentem.

Saímos muito à noite. Muito. Tínhamos um grupo de amigas maravilhoso. Divertido. Giro. Faziamos jantares, muitas vezes em minha casa. Elas cozinhavam. Eu fazia manicure e maquilhagem. E depois, invariavelmente, bares e a Kapital, a saudosa Kapital. Home away from home.

Tentámos frequentar um ginásio. Ser saudáveis. Durou 2 meses, se tanto. As mulheres nuas nos balneários, que se agachavam de pernas abertas para ir buscar os sapatos ou quase esfregavam as suas (muitas) partes femininas nas nossas caras, enquanto se besuntavam de Nivea, foram a desculpa perfeita para desistir.

Fizemos muitas coisas. Fomos muitas coisas. Rimos muito. Chorámos muito. E rimos mais um pouco.

Com a Maria Teresa aprendi a ser menos fechada, menos reservada. É que, apesar do começo que assim anunciava, ela nunca foi intrusiva, nunca forçou nada, nunca perguntou o que quer que fosse. Respeitou o meu tempo e espaço. E eu aprendi a confiar.

Com a Maria Teresa ganhei uma outra família, que me acolheu como filha emprestada. Ganhei um irmão maior que a própria vida, um pai maior que o universo e a Mumy 2, essa Mulher. Esse mulherão. Inspiração e força em forma pura.

Com a Maria Teresa aprendi a entusiasmar-me com as pequenas coisas. Aprendi a ver as coisas com outro olhos. É um prato de massa. Não, é a melhor massa que podes comer. É fantástica. Prova outra vez. É um orgasmo para os sentidos. Ah, eu achava que era só um prato de massa. Realmente não é.

Com a Maria Teresa aprendi o que era amizade. Sem pressões, sem cobranças, sem motivos ulteriores, sem recalcamentos. Sem necessidades de rebaixar para sentir superior. O teu bem é o meu. Pura amizade. Puro amor.

Vivemos a um oceano de distância há 9 anos.

Eu casei-me e ela foi a melhor madrinha que alguém algum dia teve.

Ela foi mãe e eu madrinha da benção que é a filha dela. A honra suprema.

Eu fui mãe e ela tornou-se inspiração. Modelo e exemplo.

Ela foi mãe novamente.

A vida aconteceu. As nossas vidas aconteceram.

Gostava de dizer que ainda falamos todos os dias. Todas as semanas. Não é verdade. Às vezes passa-se um mês e nem uma palavra. Já tentámos marcar um dia por semana para falar. Não resulta. O skype é sempre aquilo que ainda vamos experimentar. Sem sucesso.

Posso é dizer, sem medos, que continuamos na vida uma da outra como quando passávamos horas a planear a roupa para o próximo sábado.

Porque ela é parte de mim e eu dela.

Porque somos de sempre e para sempre.

Porque estamos sempre uma para outra.

Porque a admiro como pessoa, como Mãe de corpo e alma que é, como Mulher.

Hoje a Maria Teresa batizou a filha mais nova. E eu não estive lá.

Mas estive.

Sabes disso, não sabes?

Beijo da tua Patinha *


P.S. - Há uns tempos pedi à Maria Teresa que escrevesse um texto sobre a maternidade, para publicar aqui. Está há uns meses parado na minha caixa de entrada. Ainda não li, porque não quero por-lhe os defeitos que eventualmente ia pôr. Amanhã publico-o sem ler. Com confiança.

*






2 comentários:

  1. Opa!... N consigo parar de reler! Estaremos sempre na vida uma da outra! C sms ou telefonemas de 5m! Mas tenho saudades de te dar aquele abraço!...

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