segunda-feira, 16 de maio de 2016

Ser criada (também) pelas avós





Quando ainda estava grávida da CLSM, decidimos que só queríamos que ela só fosse para a escola por volta dos 3 anos. Acreditei, como acredito, que essa é uma boa solução.

Felizmente, tivemos possibilidade de o fazer, passando eu a trabalhar só na parte da manhã e ficando todas as tardes com ela. 


Às segundas, quartas e sextas de manhã, a Ximpalotas fica com a minha mãe e às terças e quintas de manhã com a minha sogra.


É uma máquina bem oleada de organização e cooperação, que tem dado bons frutos. Acho que foi fulcral uma longa conversa que tive, logo de início, com as avós - principalmente com a minha mãe - sobre o seu papel nesta equação. O papel de educadoras. Não o papel das típicas avós. As que só dão mimos e não impõem limites.


E a experiência tem corrido muito bem.


Na casa da minha mãe, da avó Cáminho, ela anda de baloiço e de escorrega. Ela vê e mexe em bichos. Tenta, pelo menos. Treina pulos e subir as escadas com um pé em cada degrau. Vai ver os pintainhos da vizinha. Rega, cava e planta. Brinca na sua casa de bonecas linda de morrer. Faz bolos dos de verdade.


Na casa da avó Cissy ela pinta e desenha. Aprende os números. Dança e canta muito. Passeia até ao jardim ou ao parque onde  brinca às escondidas e sobe árvores. Faz puzzles e brinca com legos. Pratica Yoga. Faz piqueniques e cria mesas de chá elaboradas para as suas bonecas. Brinca muito ao faz-de-conta.


Em ambas as casas ela é amada, respeitada e educada pelas avós maravilhosas que lhe calhou em sorte.


E depois ainda tem estas coisas:


CLSM -  Mamã, vou-te cantar uma música que ainda não conheces.


Eu -  Parece-me muito bem, meu amor. Adoro aprender músicas novas!


CLSM - Óia, óia, é assim: Dona gata vai pelos campos, vai andando -------- (qualquer coisa ininteligível), lá vai a dona gata ----------(palavras que ela inventou) e é a dona gata.

Gostaste, mamã?

Eu - A mamã gostou muito. E realmente nunca tinha ouvido. Onde é que aprendeste essa música tão bonita?


CLSM - É de quando eu era nova.



Beijo da Patinha *

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

La verguenza




Há uns dias fui com a CLSM a uma loja de brinquedos.

Falava com a senhora da loja enquanto ela se distraía a ver os brinquedos.

De repente viu um expositor com chupa-chupas, os olhos brilharam e perguntou-me se poderia tirar um.

Assenti. Já a armar-me e sabendo a resposta, perguntei-lhe aquilo o que era. 

E ela "é um microfone, mamã". E eu "pois claro que é".

Enquanto ela cantava os parabéns - constantemente no top 1 do seu mundo musical - ao chupa-chupa/microfone, eu explicava à senhora que tinha sido o meu marido a dizer-lhe aquilo. Que ela não comia nada com açucar - ou só em dias muito especiais - e que assim demos aos chupas outra função.

Toda eu me regozijava. Brilhava por dentro. 

Talvez também por fora, mas isso já devem ser os poros oleosos. 

Mas enquanto falava na minha preocupação com o açucar, toda eu inchava de orgulho.

Que mãe maravilhosa que eu eu sou. Conscienciosa. Atenta.

Já me sentia quase a levitar.

De repente a CLSM vira o micro ao contrário, enfia a parte do pauzinho na boca e diz "mamã, mamã, estou a fumar um cigarrinho".

Catrapum. Pum. 

O que foi isto? Ah, sim, fui eu a cair do pedestal.




Beijo da Patinha*

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Da não gravidez

Este deveria ser um texto sobre uma gravidez feliz, planeada e vivida em pleno.

Mas não.

Este é um texto sobre um aborto.

Estava a dois dias de perfazer as doze semanas de gravidez. O chamado patamar de segurança. Não chegou lá. O meu Marshmallow foi embora. Não resistiu. Não sobreviveu.

A notícia foi-me dada num gabinete frio por uma médica que não conheço. Tocou-me na perna e dizendo um nome que não é o meu disse "lamento, mas é uma gravidez não evolutiva".

Senti uma vertigem. Tiraram-me o chão. Abracei-me ao Super Gato, meu pilar e minha rocha, e ambos chorámos pelo filho que só nos foi dado por um bocadinho. Que nunca vamos conhecer. Que nos foi tirado.

Toda eu era dor. 

Partida, dilacerada, em chaga.

O meu bebé....

Como é que pode ser? Eu não tinha planeado isto assim. Não era suposto. Mas afinal eu não controlo tudo? Senti-me atingida no meu complexo de Deus. Uma chapada de humildade. Zás!

E senti-me culpada. Não pelo que aconteceu, que isso terá sido puramente cromossomático.

Culpada porque me irritei tantas vezes por não poder comer um chocolate ou beber um copo de vinho. Porque já tinha os pés a inchar. Porque estava sempre cheia de sono.

Esqueci-me que era uma dádiva e não uma cruz. A verdadeira dádiva que estupidamente tomei por garantida.

E duas imagens assombravam-me. Quase em slow motion sucediam-se uma à outra.

Os mocassins que já tinha lhe comprado e que estavam em cima da mesa da sala. À espera.

A foto da CLSM de vestido branco de Verão a segurar uma ardósia onde se lia "fui promovida a mana mais velha". Ela não sabia ainda e nunca chegou a saber. Mas era como se lhe tivesse tirado isso. Eu. Que a tivesse privado de algo que ela nem sabia que queria. 

E lembrava-me de uma conversa que tive com o Marshmallow. Estava a vestir-me e pousei a mão na barriga. Nesse momento dissiparam-se todas as dúvidas que tive - porque tive - se seria possível amar outro Ser como amo a minha filha. E disse-lhe porque senti, soube nas minhas entranhas, que ele seria tão amado como a mana.

Doeu muito perdê-lo. Perder a ideia dele, perder o colo que lhe ia dar, perder o seu cheiro, o olhar, o primeiro sorriso, as suas mãozinhas pequeninas a agarrar as minhas...Doeu muito perdê-lo.

Achei que nunca mais recuperaria. Quando acordava, naqueles milésimos de segundo antes de ganhar consciência, era plenamente feliz. Foi um pesadelo. Era como se tivesse que viver e sentir tudo outra vez, quando percebia que não o era.

E chorei, chorei muito. 

E li, li muito. A minha forma de lidar com isso foi tentar perceber o porquê. 

E ouvi, ouvi muito. Tantas pessoas que já tinham passado por isso. Há sempre alguém que passou, que tem uma irmã, uma prima, uma mãe a quem isso aconteceu. E assim tem de ser. Uma em cada cinco gravidezes tem este desfecho. Mas do alto da minha arrogância sempre soube que isso a mim não aconteceria. Zás!

E o tempo foi passando e cada vez chorei, li e ouvi menos.

Apoiei-me na minha força, na do Super Gato, na dos meus pais, família e amigos maravilhosos que tenho. Que me ouviram, consolaram e mimaram.

E suguei até ao tutano o meu bálsamo, as minhas vitaminas e o meu Prozac. A Maria do Carmo obrigou-me a agir, a reagir, a sorrir e, com tempo, a rir.

A eles, tudo.

Já passou mais de um mês desde o consultório frio e da médica que não conheço.

A ferida já fechou. A cicatriz fica. 

Quero que fique.

Porque tu foste parte de mim. Sempre serás, meu Marshmallow.








quarta-feira, 2 de setembro de 2015

E Xanan. Revela-se o segredo!






E então cá vai a novidade.

Qual é esta parceria que vos falava ontem?

A parceria mais velha do mundo. Não, não é com uma prostituta. É a parceria de um óvulo com um espermatozóide.

Estou grávida!!!!!

A Mãe Patinha está a chocar outro ovo.

E estou feliz. Estamos felizes. Tão felizes. Extáticos, na verdade.

E para quê tanto suspense? Eu explico. Porque estou farta até aos cabelos - que agora vão cair menos - de ter,  por parte daquelas poucas pessoas a quem contei a novidade, esta reação:

               - Já sabia.

À exceção do meu rico e despistado paizinho que gritou de felicidade, é sempre com isto que tenho de levar. Ar de importância, sorriso de sabe-tudo e um já sabia.

Mas como já sabias? Por acaso és bruxo ou teste de gravidez?

E dar parabéns, não? Que bom, que felicidade, já não se diz?

Desde quando o mais importante não é congratular as pessoas, mas ter a certeza que elas saibam que estávamos cientes do motivo da congratulação? Que terrível subversão.

Dá para ver que fico um bocado irritada com isto?

E como já estou inundada de hormonas e não posso acumular mais nada cá dentro, vou fazer de conta que estou na psicoterapia, recostar-me e falar.

Por isso:

                1- Para aqueles que já sabiam que estava grávida porque já estou com barriga.

Não podiam saber. Porque estou com 8 semanas de gravidez e, logo, esta não é uma barriga de gravidez. Esta é uma barriga de tabletes Milka e e M&M's. E de Kinder Bueno.

Porque teria de ser elefante - e não só parecer - para já estar grávida há 9 meses e ainda me faltarem mais 7 meses.

E não podem sentir, não. Porque batatas fritas receita campesina não dão pontapés.

Porque o simples facto de me poderem ter visto a espetar a minha barriga de não grávida há 6 meses para passar à frente no supermercado ou para estacionar junto à porta do Centro Comercial não vos ajuda na vossa pretensão.

Nem abona muito a meu favor, agora que falamos nisso...

   
              2- Para aqueles que já sabiam que estava grávida porque já uso roupas de maternidade.


Estas são as minhas roupas normais. Há 3 anos, pelo menos. Tendas e toldos.


              3- Para aqueles que já sabiam que estava grávida porque, de um dia para outro, deixei o copo de vinho branco, o chocolate, os gelados, as batatas fritas, os cigarros e a Coca-Cola Zero


Sim, mãe, tu.

Bem jogado.


            4- Para aqueles que já sabiam que estava grávida porque sabiam que eu tinha planeado engravidar no dia 14 de julho às 22:30h e portanto tinham a certeza que eu engravidaria no dia 14 de julho às 22:30h.



Meus queridíssimos amigos do coração. Como me compreendem. Como me conhecem.

E quão bem afagam este meu ego planificador gigante e enaltecem o meu eterno Complexo de Deus.

Amorosos.

De qualquer forma, parabéns vem antes de já sabia. Fica o reparo.


Pronto, já me sinto melhor. Já tirei isto do meu sistema e já destilei todo o fel. Viva a psicoterapia dos pobres!

Fica a faltar o texto mais cutxi-cutxi sobre a gravidez. 

Aquele das lágrimas nos olhos. O dos sonhos e dos anseios. Das dúvidas e dos receios. 

Fica para depois. 

Já deu para ver que isto vai dar pano para mangas, não?

Já vos disse que estou tão feliz?  Que estamos felizes? Tão felizes. 

Extáticos, na verdade!

Só não pulo de felicidade porque me dá azia.


Beijo da Patinha *



     
         




segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Psssstttt....




Tenho uma coisa para vos contar.

Uma novidade. 

Estão preparados? 

Muito bem, conto amanhã.

Acham que não ia fazer charme e suspense? Era bom de se ver, agora...

Posso é levantar a pontinha do véu e dizer que se trata de uma colaboração maravilhosa que andei aqui a engendrar.

A Mãe Patinha esteve ausente, mas não morta.

Me aguardxi.... 

(resquícios dos meus tempos de telespetadora de novela brasileira)


Beijo da Patinha *

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Dessa coisa de largar as fraldas




Tinha já marcado no calendário há uns tempos. Tinha inevitavelmente de ser cumprido .

Este fim-de-semana ficámos os três de molho em casa, numa maratona para a CLSM largar as fraldas.

Ela fez dois anos a semana passada. Diz que está na altura. Mas mais até porque começou a fazer alergia à fralda. Provavelmente porque agora vivemos no Inferno. 

Porque eu gosto de fraldas. Gosto. Querem coisa mais prática?

Lá terá a triste piquena  de aprender a arte milenar do aguenta enquanto podes e do shake shake shake signora porque não há papel higiénico, quando já não dá para aguentar.

Identificada a questão, agendei, consultei teorias, pensei e delineei estratégia.

Optei pela abordagem hardcore. Só podia. O tudo ou nada.

Bare bottom, que é como quem diz à descarada e de rabo à léu, dois dias inteiros. Em casa. 

Só nós e aquilo. O bacio.

E xixi. Muito xixi. 

E cocó. Sim, também houve cocó. Meio fora, meio dentro do bacio. Poderia ser pior.

Estava convicta que não iria ser fácil. 

Para ela, porque não gosta de estar nua, porque não gosta de falhar - mas vais ter de aprender, meu repolho - e porque interioriza as regras como se dogmas se tratassem.

Para mim, porque sabia que iria ter pouca paciência.

Na verdade pensei que poderia ser genético. É célebre a palmada - a única - que a minha mãe, esse monumento à paciência, me deu quando estava nesta fase e insistia em levantar-me do bacio e fazer ao lado. 

Eu sabia que iria mexer-me com os nervos.

E mexeu um bocadinho. Ao décimo incidente continuar a sorrir, dar um beijo, dizer que para a próxima será melhor e que não faz mal. Não faz mal? FAZ MAL ter a casa toda cheia de xixi. FAZ MAL correr para o bacio trinta vezes para acertar duas. FAZ MAL quereres ir exatamente quando acabei de me sentar. Novamente.

Berrei isto na minha cabeça uma vez. Ah, e revirei os olhos muitas vezes, quando ela não estava a ver.

Mas afinal foi só isso. 

E ri-me. 

Ri-me muito quando vi a cara de pânico que fez quando viu pela primeira vez o seu cocó. Pensava talvez que expelia rosas. Fedorentas, mas rosas, contudo.

Ri-me muito quando ela estava a beber água e comecei a sentir a água no meu pé.  Mas como é que ela está a beber a água e me está a chegar ao pé? Ri-me porque demorei algum tempo a perceber que não era água. 

Ri-me porque estávamos os três, porque chapinhou na piscina do peixe, porque fez chá e sumo de gelatina - dá para ver que alguém gosta de gelatina? - na sua cozinha nova,  porque adorou os autocolantes que ganhava cada vez que conseguia ir ao bacio, porque brincámos, porque construímos e destruímos torres, porque brincámos a rebolar na cama. Porque fomos felizes.

E já recebi o feedback desta manhã por parte da avó Cissi:

Bacio - 7

Chão -1

Nada mau! 

Ai, que a minha menina já é uma menina.


Beijo da Patinha *




quarta-feira, 22 de julho de 2015

A máquina do tempo



Imaginei-a vermelha com apontamentos dourados. Parecida à do Júlio Verne, portanto. 

Afinal é uma cópia fiel. Googlei. Parece que o meu dom para desenhar mentalmente máquinas e maquinetas é nulo. É só copy paste.

Sempre sonhei em ter uma só para mim. Que me permitisse viajar na história. Nunca iria ao futuro. Poder mandar um e-mail ao canal de História a explicar como foram construídas as pirâmides dos Maias - não, seus idiotas, não foram os extraterrestres -, constatar que tenho razão sobre a imaculada conceção, desmaiar ao sentir o cheiro nauseabundo da Maria Antonieta e tirar uma selfie - com pau e tudo - com o Marquês de Pombal.

Mas agora já não fantasio com isso. Não. Agora fantasio com uma máquina que fizesse parar o tempo. Até poderia ser igual a uma máquina de café do Continente. Uma máquina que parasse tudo e todos, menos a mim. Que enquanto todos estivessem em modo freeze, eu fizesse todas as 3 milhões, setecentos mil e cinquenta e três e meia coisas que tenho para fazer. 

Penso nisto deleitada tantas vezes.

E depois dou por mim a pensar se a culpa será minha. E é, claro. Mas será porque não sei gerir bem o meu tempo ou porque quero sempre fazer coisas a mais? É que qualquer dia nem durmo, é o que é.

E depois vejo os blogs daquelas pessoas irritantes amorosas com 10 filhos, mas sempre com ar de quem saiu de uma produção da Vogue - nem da Vogue Portugal, da Vogue mesmo -, casas maravilhosas, fotografias perfeitas e que nos vão relatando a corrida matinal ou a ida ao cabeleireiro - com uma foto ou menção discreta à Adidas e à Kerastase - e como acabaram de lançar uma coleção inteira de roupa de folhos sobre folhos.

Não se pode.

Mas um dia também irei conseguir. Vou estar a treinar para a maratona, enquanto faço uma chamada conferência para Tóquio e a CLSM vai no carrinho a fazer cálculos de aritmética. De introdução à aritmética, vá.

É isso ou deixar de perder tempo a fantasiar com a máquina de parar o tempo que faz café.

E deixar de ler blogs. É isso.


Beijo da Patinha *








segunda-feira, 20 de julho de 2015

Não lido bem a com a morte. Ninguém lida bem com a morte.

Talvez fosse mais fácil se acreditasse em alguma coisa que viesse depois, num Céu daqueles da religião ou dos filmes de 5ª categoria, em branco e com nuvens de algodão. Se acreditasse numa reencarnação ou noutro qualquer sistema de compensação ou castigo. Porque é disso que se trata, de uma tentativa de enformar o nosso comportamento, justificar sacrifícios e afastar a tão humanamente intrínseca maldade.

Mas não acredito. Acredito que a morte é o fim. Isso mata-me.

Desde que me lembro de mim, tenho medo de morrer. Tenho medo que morram os meus. O meu mundo, o meu chão.

Ontem morreu a minha avó de empréstimo. Avó do Super Gato. Conhecia-a desde os meus 16 anos. 

Era um mulher à antiga, cheia de garra e força. Numa cena de novela em folhetos, fugiu da janela de casa dos pais para casar por amor, num mundo rural dos anos 30. Tinha pêlo na venta. Era frontal e falava sem medos. A verdadeira matriarca, à volta de quem tudo girava. 

Tanta vida. Agora já não existe. Custa-me a perceber. 

Morreu aos 92 anos, rodeada das suas filhas. Poderia ser pior. Mas há pior do que simplesmente não existir?

Tudo o que rodeia a morte é tão estranho, tão macabro, tão humano. 

A dor lancinante da mais que provável despedida, sair da sala e preocupar-se se o carro tem gasolina para chegar a casa. Receber a notícia que congela e ter de preocupar-se com o jantar. Pensar na cerimónia quando só se quer encolher em posição fetal, mas falar com o cangalheiro calma e educadamente. Ser capaz de dar-lhe bom dia, como está, e rasgar na boca tensa um sorriso. O abandono ao choro seguido da conversa de circunstância nos funerais. E aproveitar para fazer aquela pergunta àquela pessoa que já não se via há tanto tempo e que não se sabe quando se voltará a ver.

A sequência ilógica e desconcertante do metafísico e do trivial.  

Acho que este comportamento, esta capacidade, nos está geneticamente inscrito. Só pode. Ou então seríamos só más pessoas. Será uma questão ancestral de sobrevivência - como são todas -, presumo. Nem a gente ceia nem o pai morre.

A vida continua. E continua mesmo.

E isso, durante uns tempos, ainda me custa mais.

Adeus, Avó. O prazer foi todo meu.


Beijo da Patinha *


terça-feira, 23 de junho de 2015

A Maternidade segundo Maria Teresa




Eu sei que este texto já foi uma lamechice pegada de somos tão amigas e tão especiais e bla bla bla, mas não resisto a mais um bocadinho. Tenham paciência.

Resposta da Maria Teresa à ode, vulgo, texto: Adoro ver-me através dos teus olhos. 

Agora digam, é ou não a resposta perfeita?

Depois começou com um chorrilho de elogios que, apesar de sobejamente merecidos, eu não reproduzo. E não por ser ciente do meu espaço que isso já lá vai - até porque quem escreve num blog sobre a sua vida não será exatamente a pessoa mais privada do universo -, mas porque sou uma pessoa muito modesta. Ah, não tinham reparado?

Os elogios rasgados compensaram - que isto escrever para aquecer não está com nada - estar até às 2 da manhã a escrever no telemóvel - sim, no telemóvel - sobre uma luz que nem iluminava um pirilampo e em pleno fim-de-semana romântico com o SG.

Eu realmente sou uma pessoa maravilhosa, muito especial e a melhor amiga do mundo. 

(Tive de acrescentar a "melhor amiga do mundo", porque ela, por lapso, esqueceu-se.)

Mas depois disso percebi que afinal também adorava ver-me através dos olhos dela. Disse-lhe. Pronto, repeti o que ela me tinha dito. Não foi exatamente genial.

Resposta da Maria Teresa: É essa a nossa magia. Vemo-nos à melhor luz.

Toma, mais uma resposta perfeita!

Já me começas a enervar...

Adiante.

Como o prometido é devido  - e comigo, atrasado e com um intróito infindável - cá vai o texto da BFF.

Assim às cegas e à confiança. Copy Paste e publicar. Amanhã leio.


A Mãe Patinha convidou-me para escrever um texto para o blog. Sendo eu uma “stay home mom” de duas princesas (MF de 2 anos e meio e MJ com quase 6 meses), como não falar sobre algo relacionado?! A verdade é que mesmo que eu quisesse… A “minha mais velha” (adoro usar esta expressão meio bimbalhoca) tem mais vida social que eu! Mais?! Quem é que eu quero enganar? A “minha mais velha” tem vida social! Ponto.

Após uns bons 10 anos (pelo menos assim mais à séria), voltei ao desporto. Bem, voltei ao desporto que é como quem diz acompanho a minha princesa mais velha nas aulas de natação. Não conta?

Este sábado lá fomos as 2, de touca cor-de-rosa, a fazer pandã, ela excitadíssima e linda com o seu fato-de-banho às risquinhas brancas e azuis e eu de fato-de-banho de natação, portanto um verdadeiro trambolho, mas feliz por ela.

A Dadá (avó paterna) ficou com a princesa mais nova. Como dou maminha em regime livre e a Dadá também tinha os seus afazeres, procurei ser o mais prática e rápida possível. Por isso, fomos logo com os fatos de banho vestidos. Depois da aula, uma passada rápida no duche só para tirar o cloro, vestir e “allons-y”.

Fomos praticamente as primeiras a chegar. A MF estava desejosa de entrar na piscina. Brincou, chapinhou, deu umas braçadas ao colo da mamã, fartou-se de dar mergulhos e beber uns pirolitos (faz parte). Foi uma festa e ela estava tão feliz que eu quase que esqueci as minhas pendurezas. Quase, até regressar ao balneário… Fomos as primeiras a entrar na aula e as últimas a sair, pelo que só no regresso fui novamente confrontada (após mais ou menos 10 anos) com a realidade “sui generis” dos balneários femininos. Só que desta vez eram só mamãs e os respectivos rebentos. Em 10 anos, devo dizer, nada mudou.

Mulheres, mães, em pelota, nas poses mais naturais: agachadas no duche, rabo para o ar para apanhar o champô, esfrega daqui, esfrega dali,  perna alçada no banco para pôr creme, apanha toalha, calça chinelo, despe, veste…uma canseira!

E depois há de tudo! A púdica, que veste o soutien por cima da toalha – parece que está num reality show e tem medo que lhe filmem as mamocas; a boazona, que sabe que é uma brasa e por isso passeia-se com naturalidade pelo balneário qual gazela a saltitar – confesso que só lá vi wannabes ; as snobs que procuram um recanto fechado – espertas! ; as que têm muito orgulho numa parte do corpo, geralmente as maminhas, e então vestem-se todas, deixando o “santo graal” para o fim e andam por ali a passarinhar; as intrometidas que não têm qualquer pudor em olhar para as outras para “tirar medidas” (váde-retro!); e as que fingem que estão completamente à vontade com o seu corpo e que aquilo é tudo muito natural – fazem o que têm a fazer de costas ou de cabeça em baixo. Esqueci-me de alguém? É capaz!..
.
Saí de lá a pensar nas minhas pendurezas…

Eu como, mais coisa menos coisa, meio pacote de bolachas por dia. O Verão já está aí a porta… Secalhar devia começar a fazer qualquer coisa, tipo desporto e dieta, não? Ou então passo a fazer como as snobs! 

Vou ali comer só mais 1 bolacha, é a última!


Mamã Linda



A Audrey e a Princesa Leia. No 30.º aniversário da MT. Dois dias depois de fazer 13 horas de avião - que odeio de paixão - meti-me noutros 2 aviões para fazer-lhe uma surpresa. Mas como é que te esqueceste de dizer que era a melhor amiga do mundo? Realmente.


sábado, 20 de junho de 2015

A BFF




A minha vida tem uma Maria Teresa. Nela entrou num dia soalheiro do Outono de 1998. Ou 1999, agora não estou certa. Ela é melhor em datas do que eu.

Vestia uma calças pretas largas de corte clássico, camisa azul e blusão de ganga. Hoje seria banal o blusão de ganga. Em 1998 - ou 1999 - não era. Era inusitado e arrojado. Perfeito.

Bonita, trigueira e com ar franco. Assim era Maria Teresa.

Ela chegou tarde - caracteristicamente, vim a descobrir - à aula de Direito Constitucional. Teve de pedir licença para passar - o espaço para pernas era semelhante ao da easyjet - e fê-lo com ar de mea culpa polvilhado com um maravilhoso sorriso travesso.

Gostei logo dela. Senti-me logo atraída para ela.

Esta pode estar a parecer uma história de amor romântico, mas é uma história de amizade. Que é outra forma maravilhosa de amor.

Acabei por conhecê-la, como sabia que seria e teria de ser. Demo-nos bem, mesmo entre tantas outras pessoas. Mas lembro-me de sentir-me intimidada. Não, não foi bem isso. Senti-me desarmada. Foi isso. Nunca tinha conhecido alguém tão sem subterfúgios -logo eu que sou a rainha deles - e tão, à falta de melhor palavra, genuína. Não que ela fosse descomplicada ou básica, nada disso. Só era transparente. What you see is what you get.  Estranho.

Conheciamo-nos há um par de meses quando ela me ligou a dizer que tinha ficado sem carro e que se tinha lembrado que, como vivíamos relativamente perto, eu poderia dar-lhe boleia para a faculdade enquanto o carro estava no oficina. (Íamos religiosamente para a faculdade às 9h. Para jogar às cartas.) Que sim, claro. Não há problema nenhum. Claro. Fica combinado.

É um bocado esquisito, não achas? -Perguntei ao Super Gato, com quem já vivia - Quer dizer, eu nem a conheço muito bem. Não achas um bocado abusador?

Eu era muito mais fechada naqueles dias. Não introvertida, que nunca fui, mas muito ciente e zelosa do meu espaço. Mas foi esse primeiro passo que moldou a nossa amizade. Ela forçou-me a sair da minha zona de conforto. Ainda o faz.

As conversas sobre cocó são frequentes, por exemplo. Sim, cocó. Por alguma razão ela adora falar sobre isso, a frequência e a consistência. Como as crianças. Delicioso.

Ela conta as coisas que pensa, que aconteceram ou que deseja como ninguém. E nem me refiro à quantidade de pormenores desnecessários que debita. Ela conta as coisas em cru. Sem filtros.

E assim, numa dança e contra-danca de descobertas, fomo-nos aproximando. Até sermos inseparáveis. Numa época de incertezas, de aventuras, desventuras, desilusões e conquistas como foi a nossa viagem universitária, ambas longe do seio materno, que tanta falta nos fazia, fomos pilar, parede e teto uma da outra.

Passávamos horas ao telefone. Telefone fixo, que os telemóveis ainda eram para cima de uma fortuna. Víamos televisão juntas. Cada uma na sua casa, mas agarradas ao telefone. Tínhamos de mudar o auscultador de orelha frequentemente, de tão quente que ficava.

Íamos às compras. Íamos muito às compras. Descobrimos uma loja de chineses, ainda eram elas uma novidade, mesmo ao pé de minha casa e foi a loucura. Era tudo tão barato, tão fashion e de boa qualidade. Não era. Agora sabemos isso. As fotos não mentem.

Saímos muito à noite. Muito. Tínhamos um grupo de amigas maravilhoso. Divertido. Giro. Faziamos jantares, muitas vezes em minha casa. Elas cozinhavam. Eu fazia manicure e maquilhagem. E depois, invariavelmente, bares e a Kapital, a saudosa Kapital. Home away from home.

Tentámos frequentar um ginásio. Ser saudáveis. Durou 2 meses, se tanto. As mulheres nuas nos balneários, que se agachavam de pernas abertas para ir buscar os sapatos ou quase esfregavam as suas (muitas) partes femininas nas nossas caras, enquanto se besuntavam de Nivea, foram a desculpa perfeita para desistir.

Fizemos muitas coisas. Fomos muitas coisas. Rimos muito. Chorámos muito. E rimos mais um pouco.

Com a Maria Teresa aprendi a ser menos fechada, menos reservada. É que, apesar do começo que assim anunciava, ela nunca foi intrusiva, nunca forçou nada, nunca perguntou o que quer que fosse. Respeitou o meu tempo e espaço. E eu aprendi a confiar.

Com a Maria Teresa ganhei uma outra família, que me acolheu como filha emprestada. Ganhei um irmão maior que a própria vida, um pai maior que o universo e a Mumy 2, essa Mulher. Esse mulherão. Inspiração e força em forma pura.

Com a Maria Teresa aprendi a entusiasmar-me com as pequenas coisas. Aprendi a ver as coisas com outro olhos. É um prato de massa. Não, é a melhor massa que podes comer. É fantástica. Prova outra vez. É um orgasmo para os sentidos. Ah, eu achava que era só um prato de massa. Realmente não é.

Com a Maria Teresa aprendi o que era amizade. Sem pressões, sem cobranças, sem motivos ulteriores, sem recalcamentos. Sem necessidades de rebaixar para sentir superior. O teu bem é o meu. Pura amizade. Puro amor.

Vivemos a um oceano de distância há 9 anos.

Eu casei-me e ela foi a melhor madrinha que alguém algum dia teve.

Ela foi mãe e eu madrinha da benção que é a filha dela. A honra suprema.

Eu fui mãe e ela tornou-se inspiração. Modelo e exemplo.

Ela foi mãe novamente.

A vida aconteceu. As nossas vidas aconteceram.

Gostava de dizer que ainda falamos todos os dias. Todas as semanas. Não é verdade. Às vezes passa-se um mês e nem uma palavra. Já tentámos marcar um dia por semana para falar. Não resulta. O skype é sempre aquilo que ainda vamos experimentar. Sem sucesso.

Posso é dizer, sem medos, que continuamos na vida uma da outra como quando passávamos horas a planear a roupa para o próximo sábado.

Porque ela é parte de mim e eu dela.

Porque somos de sempre e para sempre.

Porque estamos sempre uma para outra.

Porque a admiro como pessoa, como Mãe de corpo e alma que é, como Mulher.

Hoje a Maria Teresa batizou a filha mais nova. E eu não estive lá.

Mas estive.

Sabes disso, não sabes?

Beijo da tua Patinha *


P.S. - Há uns tempos pedi à Maria Teresa que escrevesse um texto sobre a maternidade, para publicar aqui. Está há uns meses parado na minha caixa de entrada. Ainda não li, porque não quero por-lhe os defeitos que eventualmente ia pôr. Amanhã publico-o sem ler. Com confiança.

*






domingo, 14 de junho de 2015

Por aqui não se passa fome!


Um morango a comer morangos!


A minha filha gosta de comer. Gosta mesmo muito de comer.

Ainda este fim-de-semana deixou toda uma mesa de amigos nossos boquiabertos com a velocidade a que comia. A quantidade. E o prazer que isso lhe dá.

Uma rodela de kiwi? Duas dentadas. E ainda com ele na boca já está a pedir morangos. E a piscar o olho às cerejas.

Tem a quem saia. A minha família é de comilões.

Lembro-me que, quando éramos miúdos, não era assim tão invulgar almoçarmos duas vezes. Em casa e, se a comida fosse boa, na da avó também.

A minha mãe conta - vezes demais - que, num belo dia eu, com a idade que a CLSM tem agora, desapareci misteriosamente dentro de casa.

Filipa? Nada. Onde estás? Nada.

Deu comigo escondida atrás da porta do quarto, com chocolate até às pestanas, a devorar uma tablete inteira que surripiara da cozinha.

Glup.

Além de gostar de comer, a MC, também à semelhança, tem problemas com o controle no que respeita a comida.

Ela que é atinada em tudo o mais, se lhe tiram comida vira onça. Mesmo.

Muito bem que não é com tudo. Se falarmos de sopa, massa, arroz, peixe carne, legumes, iogurtes e semelhantes, come bem, mas (talvez) não mais que as outras crianças.

Agora se falarmos de bolacha, pão, queijo, fiambre, tudo o que seja fruta e o (muito pouco) açucar que come quando o Rei faz anos, aí a música já é outra.

É o terror.

Há uns dias abrimos a época balnear.

Decidimos tomar um pequeno-almoço tardio no bar de praia, enquanto ela lanchava.

Quando as nossas tostas mistas finalmente chegaram - tiveram de ordenhar a vaca e matar o porco - a CLSM já tinha lanchado.

Um iogurte, 5 morangos médios e duas bolachas Maria.

          - Pão. Pão pá Mia Cámo.

          - Amor, o senhor ainda nem pousou o pão na mesa.

           - Pão. Pão pá Mia Cámo.

           - Tu já lanchaste. Agora a mamã e o papá vão comer.

            - A Mia Cámo tem fome.

            - É impossível teres fome, Maria do Carmo. Comeste o suficiente.

            - A Mia Cámo tem muita fominha. A Mia Cámo tem muita fominha.

            - A mamã então vai dar-te o último morango que trouxe.


Era o morango das emergências.

Foi-se em três dentadas.


            - Queizio pá Mia Cámo.

            - A mamã não te vai dar queijo porque tu já lanchaste, meu amor. Este é da mamã.

           - Fiambi. Muito fiambi pá bebé.

           - Nem fiambre muito menos.


Conquista pelo charme. Sorriso maroto, cabeça inclinada:


           - Pãozio pá bebé. Na boca. Aqui na boca, mamã.

           - A mamã não te vai dar porque já comeste o suficiente.


Conquista pelo cansaço. Olhar esgazeado:

           - Pão pá Mia Cámo.

           - Pão pá Mia Cámo.

           - Pão pá Mia Cámo.

           - Pão pá Mia Cámo.

            - Pão pá Mia Cámo.


Já engolíamos as tostas para acabar com o martírio. Estive mesmo prestes a deitar o pão fora. Mas não deitei. Não fosse ela filha de quem é.

          - Pão pá Mia Cámo.

          - Pão pá Mia Cámo. Agoia.

         - Pão na boca da Mia Cámo.

         - Pão pá Mia Cámo.

Em desespero já olhava para o Super Gato sem saber o que fazer. E de repente vi o copo plástico com tampa que tinha servido para levar os morangos.

Ela entretém-se imenso com aquilo, a tentar abrir. Nunca conseguiu.

Dei-lhe, cheia de esperança.

Funcionou. Ela esqueceu-se.

Durante um minuto, só se ouvia o som do mar e o tagarelar das pessoas.

Praia.

O SG e eu olhávamo-nos. Incrédulos e aliviados.

Ela conseguiu abrir a tampa.

Mostrou-me o copo. Toda feliz e orgulhosa.

         - Põe aqui dento, mamã!

        - O quê, amor?

         - Pão pá Mia Cámo.



Beijo da Patinha *